Luiz Inácio Lula da Silva tem público por onde passa. Em visita recente ao Nordeste, reuniu militantes em torno de si. Em Pernambuco, ficou três dias. No segundo dia, terça 12, esteve na sede da Fetape*, na cidade de Carpina. Discursou para um público eufórico, pouco mais de 600 pessoas, que gritavam seu nome.
Mas Lula não é o mesmo que incendiava multidões nas greves do ABC Paulista. Também não é mais o irretocável presidente de sete anos atrás, aclamado como o líder que reinventou o País.
Quando adentrou o auditório, uma quase histeria coletiva tomou conta do lugar. As pessoas entraram em alvoroço e a organização do evento perdeu o controle sobre quem poderia assistir ao encontro. Foi a “solução” para o grupo de jornalistas que não sabia se teria o direito de participar do evento. A gritaria durou 10 minutos. Teve de sofrer intervenção. Que pensariam dessa recepção os não convertidos ao lulismo? Seria encenação? A essa altura fica difícil crer no “homem do povo” que, como político, fez o povo descrer de vez nos políticos.
Aos 70 anos de idade, Lula ainda tenta mostrar disposição. Disse estar com “a cabeça de 40, a saúde de 30 e a esperança de 20”. Vai à luta sob o álibi de querer que o País “volte a crescer”. Mas, hoje, todos já o conhecem bem. Sabem que ele mudou. Sua aprovação popular já não é a mesma. Não é segredo seu natural abatimento e mágoa contra a Justiça e o Congresso. O último deu um “não” a sua protegida. Já o juiz Sérgio Moro, a quem Lula não para de atacar, e é considerado o “bicho papão” da politicada, tem em mão um processo que recomenda a prisão do petista. Isso o deixa aborrecido, como também o aborrecem as investigações à mulher, Marisa Letícia, e aos filhos do casal.
Como se não bastasse, Lula chegou atrasado a Carpina. O famoso “Lula Pixuleco”, figura que não falta às grandes manifestações Brasil afora chegou primeiro, 50min antes, às 14h30 (Lula chegou às 15h20). O “Pixuleco” foi erguido à margem da BR-408, na entrada da cidade. Este teve um público muito reduzido. Porém, foi mais saudado de forma espontânea por transeuntes. No coração do modesto público pulsava o grito do “basta”, sentimento idêntico ao da maioria dos brasileiros hoje. Dois dos manifestantes aceitaram falar. João Pedro Cavalcanti, ex-coordenador do Movimento Brasil Livre (MBL) em Pernambuco, disse que o movimento deseja “o fim da corrupção, a conclusão do impeachment e a derrubada do aparelhamento do Estado”. Já o atual coordenador do MBL, Paulo Fernando, falou da importância de “mobilizar as pessoas para fiscalizar o governo interino de Michel Temer, além de oferecer apoio ao prosseguimento da Operação Lava-Jato”. Eles, a exemplo da maior parte da população, sabem que Lula busca aporte no Nordeste para fugir da rejeição no Sul e Sudeste que já atingiu picos de 67%, e quer incendiar as massas por aqui para, talvez, relembrar os velhos tempos em que sacudia os trabalhadores do ABC Paulista ao Chuí. Agora é diferente. Falta quem queira espontaneamente carregá-lo nos ombros. É certo que alguns nutrem verdadeira devoção por ele, mas são pessoas a respeito de quem os brasileiros em geral têm muita razão para desconfiar.
Ainda no auditório da Fetape, Lula movia-se de um lado para o outro, visivelmente cansado. Na maior parte do tempo, o discurso não dialogava com a lógica, a exemplo dos que foram proferidos durante cerca de quatro horas somadas entre Petrolina, Caruaru, Carpina e Recife. Dessas, em cerca de duas horas e meia o ex-presidente “não dizia nada com nada” ou vitimizava o Partido dos Trabalhadores, ou culpava antigos aliados pelo “golpe”, ou exercitava seu lado quase humorístico.
Na parte lúcida, contou uma ilustração para explicar ao público que Dilma Rousseff vinha fazendo um mau governo. Esse golpe foi engolido a seco pelos crentes que repetiram por anos que ela fazia um governo sublime. Enfim, agora terão de sair repetindo que o governo de Dilma ia mal. Mesmo assim Lula lembrou-se de recomendar ao público que incomodasse os senadores pelo ‘zap zap’ (sic) a votarem contra o impedimento de Dilma (presidente afastada pelo Congresso).
Era a imagem de alguém que, apesar do abatimento pessoal, rebusca a capacidade de se reinventar e encarar as derrotas de cabeça erguida. À sua frente a plateia gritava “fora Temer”, “Volta Dilma”, “Não ao golpe”, “Vai ter luta” e “Lula guerreiro do povo brasileiro”. Mas essa é uma luta que não tem ampla recepção coletiva.
Tudo que a experiência pode trazer ao homem, trouxe ao ex-presidente. De todas as formas, Lula tenta assanhar o Brasil. Faz mea culpa, inflige a Dilma os fracassos em um excesso de humildade incompatível com sua personalidade a pouco revelada. O poder de fogo de Lula assemelha-se a um fogo de artifício que não dispara.
*Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco
Do ABC Paulista ao Chuí, a linha do tempo de Lula
Sivaldo Venerando. Tecnologia do Blogger.
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