Crônicas (Tico)

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A moça acorda e o concriz pousa no espelho da cama. O pássaro é objeto de troco na troca. Foi num desses rolos que o pai de sua dona fez com outros criadores e, na volta de um canário melhor, contra um mais fraquinho, Tico veio para suprir o “prejuízo”.
Tico é respeitado entre os Arcanjos; - quase esqueci que a moça tem sobrenome de anjo -, mas só respeita sua dona. Dona, que, aliás, ele mesmo elegeu. Foi no seu primeiro dia de soltura. Ao ver-se fora da gaiola percorreu a casa inteira sem deixar que ninguém lhe pusesse as mãos. Depois de sucessivas tentativas, os Arcanjos desistiram do bicho, já no quarto da moça. Foi quando iniciou uma espécie de paixão. Ela chamou, ele pousou nas mãos na maior intimidade.
Definitivamente o pássaro estabeleceu a hora de voltar à gaiola. É adestrado, já nasceu em cativeiro. Dizem também que aprende a cantar, soletra o Hino Nacional. Não gosta de receber ordens, por isso escolheu dona; não obedece relógio, obedece carinho, afago feminino.
Enquanto ela dorme, ou nega-lhe carinho, o concriz canta, saltita, foge de outras investidas. Quando a dona o chama, ele enfolha-se, sobe na mão, vai pelo braço se preciso até chagar à cabeça. Ali ensaia uma dança, volta à gaiola, somente colocado pela dona. Traqueja um canto feliz, rompe as horas e aguarda novo dia e novo carinho.
Ah, ia esquecendo; o bicho faz um gesto especial quando chamado pelo nome. Torce a cabeça como uma forma de gratidão, ou como quem responde perguntas. Essa atitude, por vezes, dá a impressão de que o pássaro assume um perfil com ares de quem se acha senhor de si.
Tico é carinhoso e caridoso. Assombra as intenções de desconhecidos. Só alimenta as intenções e sentimentos de sua dona, que são bons, mas o mantém preso a caprichos dentro da pequena gaiola, de onde só sai uma única vez por dia, mesmo com a porta aberta.


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Sivaldo Venerando. Tecnologia do Blogger.